Um dos primeiros desafios que o novo governo terá que enfrentar é o da formação dos médicos brasileiros. Desde o início deste ano, está vetada pelo MEC a abertura de novos cursos de Medicina pelos próximos cinco anos. Essa “moratória” tem o objetivo de reavaliar a formação médica no país.
O presidente eleito expressou a intenção de substituir progressivamente os estrangeiros do Mais Médicos por brasileiros, criando uma carreira de Estado, com salário atrativo e oportunidades no interior do país para o atendimento à população mais desassistida. Essa ideia, que tem como base uma proposta da Associação Médica Brasileira, de 2009, depende de quantidade suficiente de profissionais — hoje, o número de habitantes por médico, no Norte do país, é três vezes maior que o do Sudeste. E depende, sobretudo, da qualidade da formação.
De fato, nos últimos anos, houve uma proliferação de cursos de Medicina: hoje são cerca de 300 no país, que lançam ao mercado mais de 29 mil novos médicos por ano. O problema é que muitos foram abertos sem a devida estrutura, adotando currículos inadequados, com poucos laboratórios e didática longe da ideal. Isso faz com que haja enormes deficiências num número expressivo de médicos recém-formados.
Isso é comprovado, por exemplo, pela dificuldade de preencher as vagas de residência médica. Este ano, no exame do Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp), 40% dos recém-formados foram reprovados. Quase 70% dos médicos não sabiam medir a pressão arterial, e 68% não acertaram os procedimentos que devem ser adotados em pacientes com sinais de infarto.
Se fosse aplicado um exame de certificação em outros estados, certamente teríamos resultados similares. E se a medicina aplicasse um exame vinculado à concessão de registro profissional, como é o caso da OAB no campo jurídico, teríamos ainda menos médicos exercendo a profissão.
Para melhorar este cenário, a revisão dos cursos de Medicina precisa ser acelerada. Cinco anos é tempo demais se considerarmos que essa quantidade de indivíduos despreparados está atuando dentro do sistema de saúde e pondo em risco os recursos existentes e, sobretudo, a vida dos pacientes.
No âmbito pedagógico, há o desafio de implementar as metodologias ativas. A didática contemporânea supõe que o aluno estude individualmente, antes da aula, e os encontros presenciais discutam estudos de caso, com abordagens interdisciplinares. Menos exposição do docente, mais autonomia do aluno. Isso funciona com mais responsabilidade e autodisciplina, pelo lado dos estudantes, e mais rigor na avaliação, por parte dos professores.
Algumas inspirações podem ser buscadas no Reino Unido e nos EUA, onde as instituições de formação contam com notável infraestrutura, laboratórios de ponta e fortes incentivos para pesquisas. Segundo o mais recente ranking da consultoria britânica QS, as seis melhores instituições do mundo para estudar Medicina estão localizadas nas duas nações: MIT, Stanford e Calltech (nos Estados Unidos), Cambridge, Oxford e UCEL (no Reino Unido). E não é à toa que os dois países, juntos, têm 137 vencedores do Nobel de Medicina, entre outros importantes prêmios e honrarias internacionais.