Depois de vários meses em casa, estudando numa modalidade a distância totalmente improvisada, alguns alunos já estão até fazendo provas on-line. A questão é: essas notas podem definir a vida escolar do aluno, inclusive no caso de uma reprovação?
Embora possa parecer absurda para alguns, essa terceira alternativa não deixa de ser plausível. Isso porque a aprendizagem deve ser estruturada em ciclos, mais do que em “séries”. Os ciclos de aprendizagem não necessariamente coincidem com o ano civil, até porque as competências que os estudantes deveriam ter em cada faixa etária nem sempre podem ser desenvolvidas até o mês de dezembro de cada ano.
Então, quando estruturamos o aprendizado não em cima de acúmulo de conteúdos, e sim em função de competências, não importa tanto se o aluno está no 3º ou no 4º ano. O que importa é que, ao final de cada segmento (ensino fundamental ou médio) ele tenha desenvolvido as competências — conhecimentos, habilidades, atitudes — esperadas para o seu momento de vida. É possível redesenhar os planos de estudos com esse critério.
A opção de anular este ano letivo, depois do período tão difícil que vivemos, pode trazer danosos impactos emocionais — o que tem consequências negativas na aprendizagem futura. Seria impor às crianças mais uma frustração, fazendo-as perder um ano da vida acadêmica. É também aumentar o risco de abandono e a evasão escolar no ensino médio, que já são muito altos. Aprovar apenas os que conseguiram aprender durante o isolamento social é uma opção carregada de injustiças, pois penaliza quem tem menos recursos e acirra as desigualdades.
Ao contrário, prosseguir para a série seguinte é optar pela motivação, pelo envolvimento com o aprendizado, e confiar que os professores são capazes de reparar as lacunas e equalizar o trabalho. É acreditar que os alunos são capazes de se dedicar em dobro, aprender e seguir em frente. Essa decisão tornaria a volta às aulas, que já não será simples, menos estressante, com menos correria e mais equilíbrio.
Mas atenção: caso fosse adotada, essa alternativa não poderia ser entendida como uma “aprovação automática”, daquelas que deixam que os estudantes passem de qualquer jeito e sigam aos trancos e barrancos.
Para essa medida funcionar, há no mínimo três requisitos. Primeiro, explicar bem às famílias o que esta situação excepcional significa, como o trabalho será coordenado e como os pais e responsáveis podem acompanhar, em casa, o trabalho da escola. Além disso, reorganizar cuidadosamente os planos de ensino, inclusive incorporando a Base Nacional Comum Curricular, que já fala dos ciclos de aprendizagem. E, finalmente, contar com os mestres para fazer um trabalho muito personalizado, acompanhando a evolução de cada estudante, de forma que ninguém fique para trás.
Andrea Ramal é consultora em educação