Fonte: O GloboAutora: Andrea Ramal

 

Além da situação de miséria extrema, que faz com que milhões de venezuelanos deixem o país até mesmo a pé, enfrentando as piores condições migratórias, a Venezuela padece de mais um mal: o de ter seu sistema educacional desmoronando.

O relato de professores venezuelanos é dramático: diariamente, 70% dos estudantes não comparecem à escola. A falta de luz e de água, a falta de merenda e de transporte deixam milhares de salas de aula vazias.

Em torno de 50% dos professores também são obrigados a faltar ao trabalho todos os dias, porque não têm dinheiro para o transporte ou porque faltam alimentos em suas casas. Muitas crianças já abandonaram os estudos. “Quem pode aprender passando fome?”, desabafa um professor venezuelano no site do jornal “El Nacional” — veículo cuja versão impressa deixou de circular no fim de 2018 devido à pressão do governo.

No entanto, Nicolás Maduro mantém o discurso de que, na Venezuela, a educação é prioridade. Ele comemora ter praticamente zerado o analfabetismo e aumentado a escolaridade. Reafirma que a educação venezuelana está entre as melhores do mundo.

Seria possível checar estas afirmações analisando o desempenho dos estudantes venezuelanos no Pisa — o exame internacional de medição de competências dos estudantes. No entanto, a Venezuela é um dos poucos da América Latina que não participam deste programa da OCDE.

O governo de Maduro segue uma linha de pensadores que considera o Pisa uma invenção do neoliberalismo e que defende não ser possível comparar estudantes de países diferentes com provas de Matemática, Ciências e Linguagem.

Todos concordamos que a educação é muito mais do que isso e que os sistemas educativos devem ser avaliados também a partir de vários outros critérios, que envolvem desde a formação cidadã até o contexto histórico-social em que o ensino acontece. Mas a prova Pisa é um indicador relevante, porque mede as competências mais básicas, para ajudar a identificar lacunas e fornecer elementos para políticas educacionais. A aplicação de avaliações de qualidade, seja o Pisa ou outro exame análogo, deveria ser entendida como direito de todo estudante.

A Colômbia, por exemplo, bem ao lado da Venezuela, fez uma ampla reforma baseada justamente em avaliações da qualidade, que derivaram num programa de investimento na melhoria do ensino e no direcionamento específico para a correção de problemas nas escolas com desempenho insatisfatório. O resultado é notável: a Colômbia já aumentou a pontuação no Pisa, ficando inclusive acima do Brasil. As provas na educação são como os exames na medicina: fornecem dados fundamentais para prevenir, agir e curar. Porém, para isso, é preciso se expor — o que nem todos têm vontade de fazer.

Andrea Ramal é consultora em educação